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UM JORNALISMO PARA DESCONSTRUIR

VOZES PERIFÉRICAS

Textos de Opinião

Em tempos de pandemia e fake news, comunicadores devem desconstruir notícias tendenciosas e criar pontes entre informação de qualidade e periferias

 

Gabriela Alves - Junho de 2020

Apesar dos constantes ataques feitos à imprensa nos últimos anos, em especial, os mais recentes que marcam o atual governo, é inegável a importância existente no papel do jornalismo, não só no contexto que se apresenta em 2020, mas em todos os tempos, garantindo que a democracia possa ser compreendida e vivida – ou a tentativa disso – o máximo possível.

No entanto, faz-se necessário pensar, enquanto comunicadores, enquanto jornalistas, quais são as narrativas que temos priorizado em nossas coberturas, como isso é alimentado pela sociedade consumidora destas notícias e como os veículos fomentam a prerrogativa de temas pura e exclusivamente negativos sobre as periferias deste país continental.

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Jornalismo e linguagem

É preciso que as narrativas, as histórias sobre as necessidades da periferia, atendam aos cidadãos que nela moram, e, ao penetrar os becos e vielas, entendam o que essas pessoas têm a mostrar. Obviamente, isso está além de intervenção policial ou guerra ao tráfico. O que se espera é uma intervenção social.

Uma pesquisa realizada pelo jornalista Michel Silva, criador da plataforma “Favela em Pauta”, que produz conteúdo jornalístico por quem e para quem vivencia o cotidiano dentro das comunidades, mostrou que entre março e maio de 2019 os principais jornais que cobrem o Rio de Janeiro publicaram 80 capas com manchetes exclusivamente negativas sobre favelas. O jornalista verificou, com especial atenção, conteúdo dos jornais O Dia, Extra, O Globo e Meia Hora por 92 dias e constatou o que aqui é debatido: moradores e comunidades sendo tratados de forma estigmatizada e sensacionalista.

Michel aponta em seu artigo que: “em 92 dias, os jornais pesquisados publicaram quatro notícias positivas em capa, enquanto notícias negativas ocuparam 80 capas. Houve dias em que os jornais não abordaram assuntos relacionados às favelas em capas”.

Este é um dos problemas centrais relacionados à cobertura jornalística em bairros pobres do Brasil. E, como fator agravante deste cenário, em tempos de coronavírus e disseminação de informações falsas, ou as denominadas (contraditoriamente) fake news, se não houver atenção dos comunicadores para com estas regiões e notícias de interesse público, acessibilidade destes dados e manchetes que atendam às reais necessidades destes povos, mais desamparados estarão essas pessoas para lutar contra os males que os assombram. 

Sendo a desigualdade uma marca da sociedade brasileira, ela também se apresenta na forma como informamos e produzimos conteúdo. “Conteúdo para quem?”, devemos nos perguntar.

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Ferramenta poderosa de comunicação

Bem como elucida Atila Roque, historiador e diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil, em artigo publicado no Nexo Jornal, “a geografia segregada das cidades, a impunidade que prevalece em homicídios cometidos por policiais e a política de segurança focada na guerra e no enfrentamento armado do tráfico suspendem na prática o estado de direito e instalam o estado de exceção em certas áreas das cidades, sinalizando com uma autorização tácita para a execução dos “elementos suspeitos”. A desigualdade se manifesta nos espaços geográficos de forma pungente.

Apoiando-se em tantos motivos, o pedido é por mais olhares que não estigmatizem as notícias sobre periferia, por mais espaços como Favela em Pauta, Agência Mural, Projeto Manivela, Voz da Comunidade, Perifa Connection, Vozes das Periferias, Periferia em Movimento, e tantos outros. Em entrevista ao programa “Profissão Repórter”, em novembro de 2019, Jorge Abrahão, coordenador geral da Rede Nossa São Paulo e responsável pelo Mapa da Desigualdade, declarou que é necessário investir desigualmente em lugares desiguais para acabar com esta disparidade social. A frase, que parece redundante, parte de uma premissa importante: aquele não possui privilégios deve, sim, ser prioridade. Que comecemos, então, pelo jornalismo.

Michel Silva, outra vez, de maneira certeira, escreveu: “o jornalismo de favela é uma ferramenta de comunicação poderosa que assusta a grande imprensa”. É o momento de uma cobertura jornalística que cumpra o papel da comunicação social.

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GABRIELA ALVES

Estudante de Jornalismo na Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação.

@agabigabriela

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